quinta-feira, 1 de abril de 2010

Fundamentos do Existir


Book of Fairy Tales, by Louvre89

FUNDAMENTOS PERDIDOS


Fundamentos são os que ditas mudo,
Delongados à vã noite vespertina,
Quando era crepúsculo o Passado diurno,
E as maleitas, falácias escritas.
Foram fundamentos no escuro,
Ebúrnea a tua letra erudita.

Rimaram sem rima os versos,
Tão soltos que os diria magos da magia.
Que contigo os fundamentos escreveram
Os da vida que se procria.
Que não morrem com os que morreram
Os que a branco vêem a escrita escurecida.

Anos são milénios, os que se vão,
Algures dormentes no caído da História.
Extintos do pensamento, porém não do coração
Aberto nos recônditos da memória,
Na essência que é só tua a paixão
Puro o sentimento da tua glória.

Ninguém o sabe, que não existe,
O Saber dito que é sabido em crer.
Contam-se, no obscurecido que persiste,
As chamas apagadas e os pavios cortados do ser.
Contam-se martírios dos sussurros que ouviste,
Mas não se contam os do reacender.

Canto perdido,
Conquanto o sangue ruge ao pulsar.
É esse sussurro que te é, ao ouvido,
A brisa que sopra leve no marulhar,
A promessa do que um dia foi prometido,
Promessa que irá um dia despertar.

Insiste, persiste no florir.
Do tímido despontar que te anseia,
Revejo desfocado aquele sorrir,
Tão tua a cândida luz que encandeia
Quando é luar solene, o do sentir,
No reflexo do rumor da lua cheia.

Sereno o Sempre que é teu,
Cravou-se descontido no coração.
Esse espelho de reflexo contido pereceu,
E em pranto, foi dito o “não”,
Não à concreta certeza de ser teu
Quanto do que era a infeliz Razão.

Crês que o santo graal
É o do sentir, não o da razão sagaz.
Somente é a vontade reinante, e por mal
Mundo pensado – que não penses – perfaz
A falta infundada de desdito dito racional,
Na mente da alma perspicaz.

Olvido assim teu mistério,
Os fundamentos pintados sob o engano
Da eternidade etérea do deletério.
Que o Presente permitiu-se ao desumano
Desenlace do que era ímpio, diáfano Império,
Na passada época do desengano.


FALSOS FUNDAMENTOS

Rumores ronronantes são sonhos,
Resquícios rendilhados em linha minha
Aos cegos do pressuposto que suponho
Ser o Ser que contigo caminha.
Ser por ter sido tão cego ao olho, zarolho,
Da teoria tua que tanto definha.

E nosso, o pão de cada dia,
É veneno escutado de vão inato,
Cerne em recorte, aquela renda que procria,
Bolor e fungo e fundamento emboscado,
Embora vida, por eles proscrita,
A do pequeno bolor bastardo.

Manchas são teorizadas,
Dos membros vivos excluídos.
O que é lâmina desfere facadas,
E no corpo, doença são sagrados imbuídos
Santos de mártir mórbida fachada.
Que, no final, são teus martírios.

Era esta, só é Era,
Quando banida for a força mor.
Se não é mundo o que de natura é fera,
Meu Mundo, que te canto eu a dor,
A que em mim só faz a espera,
Esperar do fundamento o seu amor.

Debemur morti nos nostraque,
A ceifa certa do que um dia foi passando.
Nós, mas não tu, que o demo a alma ataque,
A dos vulgares que lamentam seu pranto
Pérfido das lágrimas símias de seu saque
Sequioso… Oh! É do silêncio que me espanto.

Inverno, excluo-te do cosmo.
Hirta, vontade é a minha a de banir
Corrente que te aprisiona ao abismo,
E essa é a vontade, ó Fundamento do sorrir.
A minha e a dos cegos do aforismo,
Que veneram os Fundamentos do Existir.

Ouve, que te chamamos,
Fala ao mundo com a voz dos séculos
Nocturnos que adormecidos reclamamos.
Que quão são os teus ditos belos,
As máximas mínimas que imenso amamos,
Nós, os que te veneramos, nós, os incrédulos.

O ACORDAR DOS FUNDAMENTOS

Criaturas de credo incerto,
Recuso-vos a existência do não poder.
E peço aos deuses, que me escutam de perto,
No seu longínquo escutar do adormecer,
Peço-lhes o céu, e da voz o eco,
Do que foi um dia o grito de viver.

Ressuscita, de alma conquistadora,
Ressurge das cinzas, Fénix minha.
Sê a ave da espécie vindoura,
A da magia e do mito que caminha,
Sê assim, Fénix, nossa suprema senhora,
A senhora chamada Renascida!

Idolatrada essa força, a que tens,
Em palavras anciãs de ânsias inconstantes,
Reúnes das virtudes, em tuas mãos, os bens,
D’aqueles que não passam de puros instantes
Que sempre viveram dos ícones que deténs,
Cansados do que são, similares dos semelhantes.

Sonho novamente,
O mesmo que há séculos sonhei.
Mas eu, reencarnação de demente,
Sei-me são em tudo o que sei.
E creio que do meu devaneio de mente,
Será sonho meu, nossa lei.

Tu, só tu… sobre ti,
É o sonho contigo, o conhecido,
Das Cassandras da vidência em mim.
E murmúrio é agora o ouvido,
Que se adensa no nevoeiro espadachim
Do recortar que antecede o alvorecido.

Invades, então, a razão perpétua,
Despontada já é a beleza do pensar.
Tua é a alma despida, de preconceitos nua,
Nívea, imaculada no seu eterno conjecturar.
É essa a dramática peça que em mim actua.
Essa é a peça onde irei actuar.

Nalgum remoto nunca,
O Nada tentará evitar a tua renascença.
E porquê? Surge a pergunta,
E a resposta é a da inveja em sua crença,
Ínfimos muitos onde infinito s’ajunta,
E cresce em imortal crescença.

Ontem, foste nosso almejar,
Hoje és realidade que havia de ser.
Causa a qual quiseram fiéis amar,
Perante a força do esquecer.
Que, do tudo, só tu os podes sagrar
Santos, os Fundamentos do Viver.

(E isto foi uma prenda que fiz para um amigo. Porém, presumo que não lhe tenha agradado de sobremaneira, ou que nem sequer tenha adquirido o necessário tempo para a ler. E, no entanto, deixo-a a vós, meus caros e queridíssimos amigos, esperando que gostem ^^)

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